Inicialmente
o Parecer descreve o cenário do julgamento do Recurso Especial 1.221.170/PR e
transcreve diversos trechos dos votos, a fim de identificar o novo delineamento
de insumo para fins de creditamento em sede de Pis e Cofins. Deste movimento
inicial surgem os seguintes apontamentos:
“Consoante
a tese acordada na decisão judicial em comento: a) o “critério da
essencialidade diz com o item do qual dependa, intrínseca e fundamentalmente, o
produto ou o serviço”: a.1) “constituindo elemento estrutural e inseparável do
processo produtivo ou da execução do serviço”; a.2) “ou, quando menos, a sua
falta lhes prive de qualidade, quantidade e/ou suficiência”; b) já o critério
da relevância “é identificável no item cuja finalidade, embora não
indispensável à elaboração do próprio produto ou à prestação do serviço,
integre o processo de produção, seja”:b.1) “pelas singularidades de cada cadeia
produtiva”; b.2) “por imposição legal”. Dispositivos Legais. Lei nº 10.637, de
2002, art. 3º, inciso II; Lei nº 10.833, de 2003, art. 3º, inciso II.”
É
inequívoco que a Receita Federal usa de forma direta dos fundamentos da decisão
do Recurso Especial em comento, todavia, deixa transparecer rigor
interpretativo, com evidente finalidade de restrição de uso de créditos, o que
não se identifica do conteúdo do acórdão.
As
referências a “elemento estrutural e inseparável do processo produtivo”,
indispensabilidade à elaboração do produto inequivocamente são tomados com
finalidade restritiva, já permitindo ao contribuinte antever que o aumento do
volume de créditos sobre esta previsão deverá ser objeto de fiscalização pela Receita
Federal, a qual já sinaliza rigor na análise do que será aceito como integrante
indispensável do processo produtivo.
Mister
salientar que a postura restritiva já delineada pela Receita Federal não é
exatamente a mensagem contida no julgamento realizado pelo STJ, conforme
assevera-se da transcrição de trecho do voto do Min. Mauro Campbell e
também constante do Parecer ora comentado.
“Em resumo,
é de se definir como insumos, para efeitos do art. 3°, II, da Lei n.
10.637/2002, e art. 3°, II, da Lei n. 10.833/2003, todos aqueles bens e
serviços pertinentes ao, ou que viabilizam o processo produtivo e a prestação
de serviços, que neles possam ser direta ou indiretamente empregados e cuja
subtração importa na impossibilidade mesma da prestação do serviço ou da
produção, isto é, cuja subtração obsta a atividade da empresa, ou implica em
substancial perda de qualidade do produto ou serviço daí resultantes.” (fls 50,
59, 61 e 62 do inteiro teor do acórdão)”
A seguir
a Receita apresenta diferenciação entre conceitos de fabricação e produção,
afirmando que o segundo termo se destina a identificação de processos de
aglutinação de produtos e serviços para criação de novo item, sem se enquadrar,
contudo, no processo de industrialização sujeito à incidência do IPI.
De
modo inicial, a diferenciação indica postura ampliativa da Receita Federal. A
questão será o manejo deste entendimento coadunado com as posturas restritivas
acima. Todavia, somente a aplicação rotineira deste Parecer permitirá aos
contribuintes saberem se de fato a divisão de conceitos lhes será favorável.
Sequencialmente,
a Receita Federal afasta a possibilidade de créditos de insumo em atividades
exclusivamente comerciais, especificadas como de revenda de bens. Tal discussão
sobre possibilidade de creditamento de empresas comerciais é debate antigo,
existindo possibilidades de questionamento. Contudo, certo que o órgão
Fazendário manteve nesta publicação a mesma postura de atos e decisões
anteriores.
Ponto
positivo o Parecer Normativo Cosit n. 5/2018 é o enfrentamento do tema denominado
de insumo do insumo.
Considerando-se
a decisão do STJ, insumo é conceito que atinge toda a cadeira produtiva,
gerando extensão de seu conteúdo e passando e legitimar créditos decorrentes de
manutenção e conservação dos itens utilizados diretamente na produção.
Desta
situação surge o conceito de insumo do insumo, a ser exemplificado como as peças
de esteira necessária à produção de biscoitos.
Para
este cenário a Receita Federal fixa que a permissão de creditamento retroage no
processo produtivo para alcançar os itens utilizados para
manutenção/permanência/estruturação do item considerado essencial e diretamente
envolvido no processo de produção de bem ou prestação de serviço.
“Assim,
tomando-se como referência o processo de produção como um todo, é inexorável
que a permissão de creditamento retroage no processo produtivo de cada pessoa
jurídica para alcançar os insumos necessários à confecção do bem-insumo
utilizado na produção de bem destinado à venda ou na prestação de serviço a
terceiros, beneficiando especialmente aquelas que produzem os próprios insumos
(verticalização econômica). Isso porque o insumo do insumo constitui “elemento
estrutural e inseparável do processo produtivo ou da execução do serviço”,
cumprindo o critério da essencialidade para enquadramento no conceito de
insumo.”
Acerca
deste tema é necessária organização do contribuinte para a diferenciação entre créditos
de insumos e créditos de ativo imobilizado, os quais evolvem critérios de
exaustão e custo de aquisição.
Da mesma
forma, reconhece a Receita Federal o conceito de insumos por imposição legal,
admitindo a possibilidade de creditamento sobre itens cuja presença na cadeia
de desenvolvimento do produto ou serviço decorrem de uma imposição legal.
No
próprio parecer são mencionados EPIs, testes de qualidade, vacinas.
No
tocante à situações desenvolvidas após o encerramento do processo produtivo
(frete, embalagens para vendas a distância, etc), A Receita Federal mantém a
posição de serem insumos os itens cujo manejo decorrem de imposição legal,
excluindo-se todos os demais.
Sob
este tópico é necessária reflexão sobre os critérios da essencialidade e
relevância, pois de fato o julgamento do Recurso Especial n. 1.221.170/PR não
concedeu aos contribuintes uma carta em branco para o creditamento de insumos.
Novamente
vale a observação de que as empresas
produtoras ou prestadoras de serviço necessitam da descrição real e correta
de suas atividades, realizando simulações sobre a presença ou ausência do item
em seu objeto social, considerando ter sido esclarecido pelo poder Judiciário
não subsumirem-se a conceitos de insumos custos do empreendimento em si
considerado.
Entre
os itens 62 e 69 o Parecer trata dos insumos na prestação de serviços e acaba induzindo
à ideia de que por meio de intepretação conjunta entre a alínea “a” do §
1º do art. 13 da Decreto-Lei nº 1.598, de 26 de dezembro de 1977 e inciso II do
caput do art. 3º da Lei nº 10.637, de 2002, e da Lei nº 10.833, de 2003 haveria
relação entre custo de produção e insumos.
Tem-se
aqui ponto de atenção e cuidado por parte dos contribuintes em caso de
fiscalizações e autuações. Muito embora o STJ não tenha adotado o conceito de
insumo utilizado em sede de Imposto de Renda (mais amplo) é inquestionável a
adoção de critério maior que o simples conteúdo do processo produtivo. São
diversos os momentos do acórdão com referências a custos indiretos.
Buscando
exaurir o tema de insumos, a Receita Federal também discorre no Parecer Normativo
Cosit. N 5/2018 a respeito da menção à produtos e limpeza e higienização
analisados no Recurso
Especial 1.221.170/PR, o qual tinha como parte empresa do ramo alimentício.
Sem a
necessidade e provocação ou questionamentos, o órgão voluntariamente estendeu a
possibilidade de uso destes itens como insumo, para além de atividades do ramo
alimentício, ressalvando-se, porém, a cautela mínima de lembrança dos quesitos
de essencialidade e relevância.
“100.
Malgrado os julgamentos citados refiram-se apenas a pessoas jurídicas dedicadas
à industrialização de alimentos (ramo no qual a higiene sobressai em
importância), parece bastante razoável entender que os materiais e serviços de
limpeza, desinfecção e dedetização de ativos utilizados pela pessoa jurídica na
produção de bens ou na prestação de serviços podem ser considerados insumos
geradores de créditos das contribuições. 101. Isso porque, à semelhança dos
materiais e serviços de manutenção de ativos, trata-se de itens destinados a
viabilizar o funcionamento ordinário dos ativos produtivos (paralelismo de
funções com os combustíveis, que são expressamente considerados insumos pela
legislação) e bem assim porque em algumas atividades sua falta implica
substancial perda de qualidade do produto ou serviço disponibilizado, como na
produção de alimentos, nos serviços de saúde, etc.”
Ponto
extremamente positivo e até surpreendente do Parecer ora analisado é o reconhecimento
da possibilidade de uso como insumo dos valores gastos com terceirização de
serviços, inclusive de atividades fins, observando julgamento do STF.
Tal
possibilidade de tomada de crédito já era defendida por diversos profissionais
da área, inclusive havendo a expressa defesa deste crédito por esta Autora,
conforme textos anteriores e publicados.
Em
sequência a esta autorização a Receita restringe creditamento sobre custos
relativos “à viabilização da atividade de sua mão de
obra, como alimentação, vestimenta, transporte, educação, saúde, seguro de
vida, equipamentos de segurança, etc..”
Há que
se ressalvar a questão dos uniformes. Para este tema deve haver análise
casuística, porém é certo que algumas atividades têm sua realização vinculada à
uniformização de seus empregados diretos ou terceirizados. É o caso de empresas
de prestação de serviços direitos à consumidor, onde a identificação visual do
funcionário é necessária, prestadores de serviços de utilidade pública
deferidos à particulares, dentre outros.
A
respeito de combustíveis e lubrificantes a Receita se posicionou mais
restritivamente. Todavia, pautando-se nas limitações contidas na decisão
judicial, corroboro este entendimento de não concessão ampla e irrestrita
de tais créditos.
O uso
de carros pelo setor comercial, representações de fato supera o entendimento
fornecido pelo Superior Tribunal de Justiça, o qual evidenciou à negação da
natureza de insumo para os aspectos negociais pertinentes ao custo de
divulgação do negócio.
“Daí,
considerando que combustíveis e lubrificantes são consumidos em máquinas,
equipamentos ou veículos de qualquer espécie, e, em regra, não se agregam ao
bem ou serviço em processamento, conclui-se que somente podem ser considerados
insumos do processo produtivo quando consumidos em máquinas, equipamentos ou
veículos utilizados pela pessoa jurídica no processo de produção de bens ou de
prestação de serviços.”
Outro ponto
relevante do Parecer é a formal identificação da base sobre a qual o valor do
insumo é calculado. A Receita Federal adotou critério legal fixado em lei de
2014.
Infere
duas observações a serem cumpridas pelo contribuinte: a análise do item
pretendido como insumo observar todas as construções acima delineadas sobre a nova
formatação do crédito e sujeitar-se o pretenso insumo ao recolhimento da
contribuição.
Esta
segunda imposição já encontra debates jurídicos e certamente, conforme o
montante financeiro a representar na cadeira produtiva, titularizará
questionamentos administrativos e judiciais.
“Assim,
após a Lei nº 12.973, de 13 de maio de 2014 (que adequou a legislação
tributária federal à legislação societária e às normas contábeis)7 , estão
incluídos no custo de aquisição dos insumos geradores de créditos das
contribuições, entre outros, os seguintes dispêndios suportados pelo
adquirente: a) preço de compra do bem; b) transporte do local de disponibilização
pelo vendedor até o estabelecimento do adquirente; c) seguro do local de
disponibilização pelo vendedor até o estabelecimento do adquirente; d) manuseio
no processo de entrega/recebimento do bem adquirido (se for contratada
diretamente a pessoa física incide a vedação de creditamento estabelecida pelo
inciso I do § 2º do art. 3º da Lei nº 10.637, de 2002, e da Lei nº 10.833, de
2003); e) outros itens diretamente atribuíveis à aquisição de produtos
acabados; f) tributos não recuperáveis.”
O
Parecer Normativo Cosit n. 5/2018 encerra trazendo compilação de seu entendimento,
cuja transcrição é a seguir apresentada:
“168.
Como características adicionais dos bens e serviços (itens) considerados
insumos na legislação das contribuições em voga, destacam-se: a) somente podem
ser considerados insumos itens aplicados no processo de produção de bens
destinados à venda ou de prestação de serviços a terceiros, excluindo-se do
conceito itens utilizados nas demais áreas de atuação da pessoa jurídica, como
administrativa, jurídica, contábil, etc., bem como itens relacionados à
atividade de revenda de bens; b) permite-se o creditamento para insumos do
processo de produção de bens destinados à venda ou de prestação de serviços, e
não apenas insumos do próprio produto ou serviço comercializados pela pessoa
jurídica; c) o processo de produção de bens encerra-se, em geral, com a
finalização das etapas produtivas do bem e o processo de prestação de serviços
geralmente se encerra com a finalização da prestação ao cliente, excluindo-se
do conceito de insumos itens utilizados posteriormente à finalização dos
referidos processos, salvo exceções justificadas (como ocorre, por exemplo, com
os itens que a legislação específica exige aplicação pela pessoa jurídica para
que o bem produzido ou o serviço prestado possam ser comercializados, os quais
são considerados insumos ainda que aplicados sobre produto acabado); d) somente
haverá insumos se o processo no qual estão inseridos os itens elegíveis
efetivamente resultar em um bem destinado à venda ou em um serviço prestado a
terceiros (esforço bemsucedido), excluindo-se do conceito itens utilizados em
atividades que não gerem tais resultados, como em pesquisas, projetos
abandonados, projetos infrutíferos, produtos acabados e furtados ou
sinistrados, etc.; e) a subsunção do item ao conceito de insumos independe de
contato físico, desgaste ou alteração química do bem-insumo em função de ação
diretamente exercida sobre o produto em elaboração ou durante a prestação de
serviço; f) a modalidade de creditamento pela aquisição de insumos é a regra
geral aplicável às atividades de produção de bens e de prestação de serviços no
âmbito da não cumulatividade das contribuições, sem prejuízo das demais
modalidades de creditamento estabelecidas pela DF GABINETE RFB Fl. 36 Documento
de 32 página(s) assinado digitalmente. Pode ser consultado no endereço
https://cav.receita.fazenda.gov.br/eCAC/publico/login.aspx pelo código de
localização EP17.1218.15393.PKHZ. Consulte a página de autenticação no final
deste documento. (Fl. 30 do Parecer Normativo Cosit/RFB nº 05, de 17 de
dezembro de 2018.) legislação, que naturalmente afastam a aplicação da regra
geral nas hipóteses por elas alcançadas; g) para fins de interpretação do
inciso II do caput do art. 3º da Lei nº 10.637, de 2002, e da Lei nº 10.833, de
2003, “fabricação de produtos” corresponde às hipóteses de industrialização
firmadas na legislação do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e
“produção de bens” refere-se às atividades que, conquanto não sejam
consideradas industrialização, promovem: i) a transformação material de
insumo(s) em um bem novo destinado à venda; ou ii) o desenvolvimento de seres
vivos até alcançarem condição de serem comercializados; h) havendo insumos em
todo o processo de produção de bens destinados à venda e de prestação de
serviços, permite-se a apuração de créditos das contribuições em relação a
insumos necessários à produção de um bem-insumo utilizado na produção de bem
destinado à venda ou na prestação de serviço a terceiros (insumo do insumo); i)
não são considerados insumos os itens destinados a viabilizar a atividade da
mão de obra empregada pela pessoa jurídica em qualquer de suas áreas, inclusive
em seu processo de produção de bens ou de prestação de serviços, tais como
alimentação, vestimenta, transporte, educação, saúde, seguro de vida, etc.,
ressalvadas as hipóteses em que a utilização do item é especificamente exigida
pela legislação para viabilizar a atividade de produção de bens ou de prestação
de serviços por parte da mão de obra empregada nessas atividades, como no caso
dos equipamentos de proteção individual (EPI); j) a parcela de um serviço-principal
subcontratada pela pessoa jurídica prestadora-principal perante uma pessoa
jurídica prestadora-subcontratada é considerada insumo na legislação das
contribuições.”
De
modo geral o entendimento do Parecer Normativo Cosit. N 5/2018 é bastante
positivo e de forma voluntária trouxe o reconhecimento oficial da possibilidade
de creditamento em sede de insumos bastante ampliada, além de evitar grande
volume de debates jurídicos.
É
necessário que os contribuintes que possam tomar créditos de insumos mantenham
uma organização acerca de seu processo produtivo, indicando com precisão e
fundamentação técnica a essencialidade e relevância dos itens.
Ainda
é possível prever a ocorrência de fiscalizações e autuações, cuja solução
dependerá de produção de provas e profundo conhecimento da legislação e, especialmente,
das decisões jurídicas e normativa administrativas da Receita Federal.
Roberta
Vieira Gemente